O Livro de Esopo
Prólogo
'' Segundo diz o Livro da vida e dos costumes dos philosofos, conta-se no tempo d’el-rei Ciro, rei da Persia, este autor vivia o qual se chama Esopo Adelpho, e foi grego da cidade de Antiochia e foi ainda poeta famosisimo e de grande engenho, o qual fez este livro em grego, e depois foi treladado de grego em latino de hüu sabedor chamado Rromulo. Aqueste Exopo no primeiro anuo do predicto rei Ciro se conta que fosse morto de maa morte por enveja.
Este Esopo em aqueste seu livro põem muitas estorias fremosas d'animalias, de homëes e de aves e de outras cousas, segundo em ele veredes, pelas quaes ele nos ensinava como os homëes do mundo devem de viver virtuosamente e guardar-se dos males.
E assemelha este seu livro a hüu orto no qual estam flores e fruitos: pelas frores se entendem as estorias, e pelo fruito se entende a sentença da estoria; e convida os homëes e amoesta-os que venham a colher das frores e do fruito.
O lobo e o cordeiro
Conta-se que o lobo bebia hüa vez em hüu ribeiro, da parte de cima, e o cordeiro bebia em aquel medês ribeiro, da parte de fundo Disse o lobo ao cordeiro:
– Porque me luxas a augua e dapnas este ribeiro?
E o cordeiro respondeo e disse homildosamente:
– Eu nom te faço enjuria, nem luxo o rio, porque a augua corre contra mim, e a augua é mui clara; e pero se a quisesse abolver, nom poderia.
Outra vez o lobo braada forte e diz:
– Nom te avonda que tu me fazes enjuria e dapno e ainda me ameaças?!
E o cordeiro outra vez homildosamente respondeo:
– Nom te ameaço, mais eu me escuso com boa razom.
E o lobo respondeo outra vez:
– Ainda me ameaças? Já semelhávil injuria me fezeste tu e teu padre, som já bem seis meses.
O cordeiro disse:
– Ó ladrom, eu nom ei tanto tempo!
E o lobo, iroso, disse:
– Ó mao rapaz, ainda ousas de falar?
E foi-se a ei e matou-o e comeu-o. ''